sábado, 21 de abril de 2012

Você "possa"?

Hora do almoço num sábado.  Enquanto aguardava por uma mesa, presencio um curto diálogo de profundidade impressionante: um simpático casal e um filhinho que aparentava ter entre 2 e 3 anos, não mais que isso, com certeza; ao ver o aperitivo colocado à disposição dos clientes que esperam por um lugar, o pai não resiste a uma inofensiva cairipinha. Mas, tomados por um grande cuidado com a possibilidade do filho querer experimentar o que o pai iria ingerir em seguida, ambos os adultos apressaram-se em dizer ao menino que aquela bebida fazia "muito mal às crianças", pois continha álcool, como apropriadamente frisava a etiqueta colada junto à torneirinha de onde saía o apetitoso líquido. Imediatamente, o garoto, ainda treinando a conjugação verbal, pergunta ao pai, que já se preparava para ingerir o tal líquido perigoso: "E você, possa?". Com um misto de surpresa e constrangimento, os pais ensaiaram uma resposta, que não cheguei a ouvir, já que minha vez de entrar chegara. Também, depois dessa pergunta, de alguém que, mesmo não sabendo conjugar um verbo, mas raciocinando com uma lógica certamente não percebida pelos pais, demonstrou claramente o que a sociedade insiste em não assumir: o exemplo dos pais no que se refere a hábitos pouco saudáveis ou, no caso do álcool, tão perigosos e danosos. O consumo do álcool e suas consequências, notadamente na violência entre pessoas, nos acidentes trânsito, é uma tragédia nacional, em nada debatida ou combatida. Pelo contrário, continuam as propagandas, os patrocínios e todo o tipo de incentivo ao consumo de álcool, a ponto de as pessoas se orgulharem do quanto conseguem beber. Quase uma imposição para a vida social, onde aqueles poucos idiotas que se recusam a consumir bebidas alcoólicas, ainda são inspiração para piadas, assim como os consumidores de álcool declarem suas preferências e quantidades com um grande orgulho, com risinhos entre os lábios. Será que a falta de debate se deve aos altos valores despejados na mídia pelas indústrias de bebidas alcoólicas? Voltando ao sábio garotinho, se a tal bebida que saía daquela torneirinha era tão danosa, porque o pai, seu  natural mentor, iria consumi-la sem pestanejar?

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